O Mistério da Casa Verde 4

O Mistério da Casa Verde 4

No qual as coisas começam a se esclarecer

Voltando para a Casa Verde, Arturzinho encontrou, junto à arvore, um preocupado Leo:

– Onde é que você, se meteu Arturzinho? Cheguei aqui, não encontrei você, me apavorei… achei que o homem tinha sequestrado você…

– Sequestrado, nada! – Arturzinho, excitadíssimo. – Eu estava dando uma de detetive, cara! E você não imagina o que aconteceu!

Um instante de suspense, e revelou, triunfante:

– Descobri quem traz a comida para o maluco. É uma garota, e lindíssima, cara! Disparado a garota mais bonita da cidade!

– Não diga! – Leo, encantado. – Bom, eu achava que alguém deveria existir… E você diz que é uma garota? Será filha dele?

– Não sei – disse Arturzinho. – Uma coisa me chamou a atenção: estava vestida à moda antiga, com um vestido comprido, mangas longas…

– Interessante – disse Leo. – Provavelmente uma roupa da mesma época daquela que o homem usa. Será que ela quer manter o cara na sua ilusão? E por que faria isso?

– Só há uma maneira de descobrir – disse Arturzinho, decidido. – Vamos falar com ela. Contamos o nosso projeto, pedimos a sua ajuda. Já pensei até na proposta que faremos. E assim: ele nos cede uma sala para o nosso clube. Em compensação, a gente ajuda o homem, na limpeza da casa, na conservação e em outras coisas. Se ele quiser uma pizza, por exemplo, a gente traz a pizza. Não precisa ficar dependendo só da garota.

Estava tão entusiasmado que Leo teve de contê-lo:

– Calma, Arturzinho, calma. Você está ido longe demais. Você nem sabe qual será a reação dessa garota…

– Quanto a isso, você pode deixar comigo. Modéstia a parte, eu sei falar com uma menina. E estou ansioso por falar com ela.

– Você parece muito interessado – disse Leo, irônico.

– E não é só por causa do homem ou da Casa Verde…

Arturzinho teve de admitir que estava, sim, impressionado com a garota:

– Ela é linda, Leo. E não tenho a menor ideia de quem seja. E eu achava que conhecia todo o mundo em Itaguaí, imagina só. Mas isso não será problema: sei onde ela mora, é só ir até lá.

Olhou o relógio:

– Mas todas essas coisas nós vamos fazer depois. Agora eu vou dormir. Estou podre, cara. Essa de passar a noite acordado foi de matar… E você também pode ir. Avise o André e o Pedro Bola que eles não precisam vir. E marque um encontro para as seis, na pizzaria do Marcolino.

Foi para casa, encontrou o pai, que estava saindo para o hospital, e que o mirou com estranheza:

– Onde é que você andou, Arturzinho?

– Na casa do André, onde mais? Eu avisei que ia dormir lá, não avisei?

– Avisou. Só que, quando você dorme na casa dos seus amigos, não volta antes do meio-dia. E agora são sete da manhã. Você não está aprontando alguma, está?

– Não estou. – Riu. – E se estivesse? De vez em quando a gente precisa viver uma aventura, não é mesmo?

– É – suspirou o pai. – Bem, agora vá descansar um pouco. Você está um caco, rapaz. Vá dormir.

Arturzinho entrou, foi direto à geladeira, estava morrendo de fome. Comeu quatro sanduíches, tomou meio litro de leite – e então foi se deitar: naquele dia, havia reunião dos professores, as aulas tinham sido suspensas. Cansado, dormiu a sono solto. Acordou sobressaltado: seis e quinze da tarde.

– Que horror! O pessoal lá me esperando e eu aqui, dormindo!

Correu até a pizzaria, e, de fato, os amigos já estavam lá, à espera.

– Leo contou que você tem grandes novidades – disse André, não sem uma ponta de despeito, que Arturzinho preferiu ignorar:

– Verdade. Acho que temos como descobrir o segredo da Casa Verde – disse, e em seguida contou o que acontecera.

– Quer dizer que tudo depende dessa garota – concluiu André. – E como é ela?

– Um avião – disse Arturzinho. – Uma das meninas mais bonitas que já vi.

– É? – André, os olhos brilhando.

– Calma, André – protestou Arturzinho. – O negócio não é namorar. O nosso negócio é fazer um clube na Casa Verde.

– Uma coisa não impede a outra – observou André, com um sorriso safado.

– Escuta, André… – comprou Arturzinho, mas antes que aquilo se transformasse num bate-boca, Leo resolveu intervir:

– Eu também tenho novidades.

Mostrou o livro que tinha sob o braço. O desenho da capa mostrava um homem de expressão feroz, cabeleira e barba grisalhas. Usava pincenê, casaca e uma gravata de laço, e apontava para o provável leitor um dedo ameaçador.

– Mas é igual ao homem da Casa Verde! – disse Pedro Bola, assombrado.

– O que não é de estranhar – disse Leo. – Olhem o nome do livro.

– O alienista – disse Arturzinho. – Espera um pouco, Leo: alienista… O maluco lá não falou nisso? Não disse que era um alienista?

– Disse. E é por isso que este livro vai nos esclarecer mito sobre ele.

– Mas o que é um alienista? – quis saber André.

– Era o nome que se usava antigamente para o médico que cuidava dos loucos.

– Espera  um pouco: o cara disse que é um médico que cuidava dos loucos.

– Espera um pouco: o cara disse que é um médico que cuida de loucos? Mas ele tem mais cara de maluco do que de médico…

– Um pouco como o personagem do livro – ponderou Leo.

Pedro Bola olhava a capa interessado:

– É do Machado de Assis – disse. – Esse eu conheço, a professora Isaura falou nele. Não prestei muita atenção, mas é um cara do século passado, não é isso?

– É – disse Leo. – Este livro é de 1882.

– Espere um pouco – protestou André. – Você quer me dizer que um livro de mil oitocentos e tantos vai explicar porque o maluco se meteu na Casa Verde?

– Explicar, talvez não. Mas acho que vai ajudar a entender o que está se passando. Inclusive porque ele conta a história da Casa Verde.

– Mas como é que a gente não sabia desse livro? – perguntou Arturzinho.

– A gente, não – corrigiu Leo. – Você não sabia. Como o Pedro Bola disse, está na lista dos livros indicados pela professora Isaura. Aliás, uma grande indicação: o livro é muito bom.

– Mas você já leu? – Pedro Bola, assombrado.

– Já. O livro é curto. E é ótimo de ler. O Machado de Assis sabe contar uma boa história em poucas páginas.

– Então dê uma de Machado – propôs André, que não era muito chegado a livros. – Conte para nós o que você leu.

– Vamos fazer uma coisa melhor: vamos conversar com a professora Isaura sobre o livro. Ela disse que está à nossa disposição no colégio. Estava em reunião, mas, assim que terminasse, poderia nos atender.

– E o que estamos esperando? – disse Arturzinho. – Vamos lá.

A reunião estava no fim quando chegaram. A professora veio ao encontro deles. Baixinha, morena, olhos buliçosos, Isaura era extremamente popular entre os alunos. Fã incondicional de Machado de Assis, não perdia uma oportunidade para falar aos alunos (ou a quem quisesse ouvir) sobre as obras do escritor:

– Vamos lá, pessoal. estou à disposição de vocês.

Foram para uma sala vazia, sentaram-se todos.

– Muito bem – disse ela. – O Leo me contou que o grupo de vocês está interessado em saber mais sobre O alienista, do Machado de assis, é isso?

– É – confirmou Arturzinho. Essa coisa da Casa Verde, a gente tem discutido muito sobre aquele lugar.

– Então vamos lá. Primeiro vamos falar um pouco sobre o Machado de Assis, que é tão importante para a cidade.

– Ele morou aqui em Itaguaí? – quis saber Arturzinho.

– Não, o Machado era do Rio de Janeiro. Criou-se lá, no subúrbio, menino pobre. além disto era mulato, e naquela época estavam em moda teorias racistas sustentando que os mulatos eram inferiores. Quer dizer: sofreu muito, ele. Mas foi em frente, tornou-se jornalista e escritor.

– E a troco de quê escreveu um livro sobre loucura?

– Esse era um tema que o interessava muito. Já havia aparecido em outros livros, como Quicas Borba. Mas nesta obra é o tema central.

Pediu o livro ao Leo, abriu-o.

– O Machado de Assis começa assim: “As crônicas da vila de Itaguaí dizem que em e tempos remotos vivera ali um certo médico, o doutor Simão Bacamarte, filho da nobreza da terra e o maior dos médicos do Brasil, Portugal e das Espanhas”.

– Bacamarte… Bacamarte… Não é uma arma antiga? – Perguntou Pedro Bola.

– É. Mas vocês já vão ver que o Machado escolheu esse nome de propósito para o doutor. Depois de estudar na Europa… naquele tempo o Brasil era governado por Portugal… ele veio para a vila de Itaguaí, casou com uma moça chamada Evarista e começou a trabalhar. Aos poucos, foi-se interessando pela doença mental. Não era um assunto muito popular, digamos assim. Conta o Machado: “A vereança de Itaguaí, entre outros pecados de que é arguida pelos cronistas, tinha o de não fazer caso dos dementes. Assim é que cada louco furioso era trancado em uma alcova, na própria casa, e não curado, mas descurado, até que a morte o vinha defraudar do benefício da vida; os manos andavam à solta pela rua”. O doutor Bacamarte então teve a ideia de construir um lugar para os malucos. Para isso, ele pretendia conseguir verba da câmara de vereadores.

– E os itaguaienses, o que disseram? – perguntou Pedro Bola.

– Ficaram curiosos, mas não gostaram muito da ideia. Diz o Machado: “A ideia de meter os loucos na mesma casa, vivendo em comum, pareceu em si mesma sinal de demência”. Até o vigário sugeriu à dona Evarista, mulher do Bacamarte:

“Veja se seu marido dá um passeio ao Rio de Janeiro”. Tinha esperança de que, com a viagem, o alienista mudasse de ideia. Mas o doutor era persistente. Foi à câmara, defendeu o projeto, conseguiu até um imposto especial: quem quisesse colocar penachos decorativos nos carros funerários teria de pagar uma quantia. E aí começou a construção da casa dos loucos.

– A Casa Verde…

– É. A Casa Verde. “Inaugurou-se com imensa pompa; de todas as vilas e povoações vizinhas, e até remotas, e da própria cidade do Rio de Janeiro, correu gente para assistir às cerimônias, que duravam sete dias.” Logo começaram a chegar os doentes. “Eram furiosos, eram mansos, eram monomaníacos, era toda a família dos deserdados do espírito.” O doutor Bacamarte estudava cada caso. O objetivo dele era, diz Machado, “…estudar profundamente a loucura, os seus diversos graus, classificar-lhe os casos, descobrir enfim a causa do fenômeno e o remédio universal”.

– Espere um pouco – interrompeu Arturzinho. – Que história é essa,  “remédio universal”? Quer dizer que o doutor Bacamarte queria um remédio que curasse todos os tipos de doenças mentais? Será que o cara não estava exagerando?

– Estava. Agora: ele acreditava no que fazia. Machado conta que o homem se dedicava mesmo: “… analisava os hábitos de cada louco, as horas de acesso, as aversões, as simpatias, as palavras, os gestos, as tendências”. Trabalhava tanto, que a mulher, a dona Evarista, se chateou. Diz o Machado: “A ilustre dama, no fim de dois meses, achou-se a mais desgraçada das mulheres; caiu em profunda melancolia, ficou amarela, magra, comia pouco, e suspirava a cada canto. Não ousava fazer-lhe nenhuma queixa ou reproche, porque respeitava nele o seu marido e senhor, mas padecia calada, e definhava a olhos vistos”. O doutor Bacamarte simplesmente mandou que ela fosse passar uns tempos no Rio de Janeiro. Podia fazer isso, porque estava ganhando muito dinheiro.

– O homem era fogo, então – disse André.

– Era mesmo. Muito pior foi quando ele começou a achar que em Itaguaí havia muito mais loucos do que  parecia no inicio. Como disse ao farmacêutico Crispim Soares: “A loucura,  objeto dos meus estudos, era até agora uma ilha perdida no oceano da razão; começo a suspeitar que é um continente”. Ele queria “ampliar o território da loucura. Para isso, era preciso separar a razão da maluquice: “A razão é o perfeito equilíbrio de todas as faculdades; fora daí insânia, insânia e só insânia”. E a partir daí foi recolhendo as pessoas à Casa Verde. O primeiro foi o Costa, pessoa estimada em Itaguaí. Rico, que acabou empobrecido: emprestava dinheiro a todos, sem juros; muitos simplesmente ficavam devendo. O doutor Bacamarte achou que esse comportamento era anormal, coisa de louco, e trancou o Costa na Casa Verde. Uma prima do homem veio procurá-lo com uma explicação para o caso: o dinheiro não durava porque o pai do Costa tinha sido amaldiçoado por um homem a quem negara um pouco d´água. O doutor Bacamarte ouviu a história e não teve dúvida: recolheu a prima do Costa também.

– E o pessoal da cidade? – perguntou Arturzinho. – Qual foi a reação deles?

– A primeira versão foi que se tratava de vingança: o alienista teria tido uma paixão secreta pela tal prima, que o rejeitara, com apoio do indignado Costa. Mas a versão não pegou, porque, diz Machado, “…a austeridade do alienista, a vida de estudos que ele levava, pareciam desmentir uma tal hipótese”. Depois disso, outra pessoa conhecida foi internada: o Mateus, um home muito rico, que construíra uma bela casa, e que tinha o costume de ficar na janela, com “atitude senhoril”, como  se quisesse ser admirado. Ouvindo falar da história, o alienista foi até a casa de Mateus, “viu-o a janela, passou cinco, seis vezes por diante, devagar, parando, examinando as atitudes, as expressões do rosto”. Com isso, fez o diagnóstico: Mateus foi recolhido à Casa Verde.

– Mas era um pavor, aquilo! – Pedro Bola, impressionado.

– Era. O pânico foi crescendo. Conta o Machado: “O terror acentuou-se. Não se sabia quem estava são, nem quem estava doido. As mulheres, quando os maridos saíam, mandavam acender uma lamparina a Nossa Senhora; e nem todos os maridos eram valorosos, alguns não andavam fora sem um ou dois capangas. Positivamente o terror. Quem podia emigrava”.

– E os caras da vila? Não faziam nada?

– Bem, lá pelas tantas eles se rebelaram. Quem comandou a revolta foi o barbeiro Porfírio Caetano das Neves. E tinha muita gente no movimento. O que eles queriam era botar abaixo a Casa Verde. Ouçam só: “O barbeiro declarou que iam dali levantar a bandeira da rebelião, e destruir a Casa Verde; que Itaguaí não podia continuar a servir de cadáver aos estudos e experiências de uma déspota; que muitas pessoas estimáveis, algumas distintas, outras humildes mas dignas de apreço, jaziam nos cubículos da Casa Verde…”

– E o alienista? – perguntou Arturzinho. – Fugiu?

– Que nada. O homem era teimoso. Enfrentou aquela multidão, fez um discurso. Ouçam só o que ele disse: “Meus senhores, a ciência é coisa séria e merece ser tratada com seriedade. Não dou razão de meus atos de alienista a ninguém, salvo aos mestres e a Deus. Se quereis emendar a administração da Casa Verde, estou pronto a ouvir-vos; mas se exigis que me negue a mim mesmo, não ganhareis nada. Poderia convidar alguns de vós em comissão dos outros a vir ver comigo os loucos reclusos; mas não o faço, porque seria dar-vos razão do meu sistema, o que não farei a leigos nem a rebeldes”.

– O barbeiro deve ter ficado por conta – observou André.

– Ficou. Fez um pronunciamento: “Meus amigos, lutemos até o fim! A salvação de Itaguaí está em vossas mãos dignas e heróicas. Destruamos o cárcere de vossos filhos e pais, de vossas mães e irmãs, de vossos parentes e amigos, e de vós mesmos. Ou morrereis a pão e água, talvez a chicote, na masmorra daquele indigno”. Mas o objetivo dele não era só destruir a Casa Verde. Ou seja: não era o mocinho da história, assim como o alienista não era o bandido. Os personagens de Machado são seres humanos, complexos como todas as pessoas. Diz ele: “Foi nesse momento decisivo que o barbeiro sentiu despontar em si a ambição do governo; pareceu-lhe então que, demolindo a Casa Verde e derrocando a influência do alienista, chegaria a apoderar-se da câmara, dominar as demais autoridades e constituir-se senhor de Itaguaí”.

– O homem era um ditador em potencial – comentou Leo.

– Verdade. E o movimento crescia. Cresceu tanto que as autoridades tiveram  de enviar à vila um destacamento militar. Mas na hora do enfrentamento os soldados começaram a passar para o lado dos revoltosos. O barbeiro foi até a câmara e lá assumiu o poder: os vereadores foram direto para a cadeia. Porfírio se proclamou “Protetor da vila em nome de Sua Majestade, e do povo”. Lançou uma proclamação contra a “câmara corrupta e violenta” e foi muito aplaudido. O barbeiro então foi à casa do alienista, que o recebeu e disse que não tinha meios de resistir à rebelião: “Só uma coisa pedia, é que o não constrangesse a assistir pessoalmente à destruição da Casa Verde”. Agora: o que  acham vocês que o barbeiro fez?

– Expulsou o Bacamarte – disse Pedro Bola.

– Mandou prendê-lo – sugeriu André.

– Nada disso. Ele veio com um papo conciliador: “Engana-se Vossa Senhoria em atribuir ao governo intenções vandálicas”… quer dizer, intenções de destruir coisas. E continuou: “Com razão ou sem ela, a opinião crê que a maior parte dos doidos ali metidos estão em seu perfeito juízo, mas o governo reconhece que a questão é puramente científica”.

– Questão científica: exatamente como dizia o alienista! – admirou-se Arturzinho.

– É exatamente como dizia o alienista. O barbeiro queria o doutor Bacamarte como aliado.

– O negócio dele era político…

– Era. O alienista também é isso, um fábula política.

Mas, continuando: com o apoio do barbeiro, que agora comandava Itaguaí, o doutor Bacamarte não perdeu tempo, continuou metendo mais gente na Casa Verde. Isso provocou grande indignação. Os itaguaienses pensavam que estavam livres do alienista, mas, ao contrário, viram que ele estava com mais poder. E protestaram. O barbeiro quis voltar atrás, fechando o hospício e mandando embora o doutor, mas já era tarde. Foi deposto, aliás por outro barbeiro, João Pina, que o acusou de estar “vendido ao outro de Simão Bacamarte”. Nisso, conta Machado, chegou uma força  enviada pelo vice-rei e restabeleceu a ordem, acabando com a revolta. Começou internando o barbeiro Porfírio e vários outros rebeldes. Depois foi o presidente da câmara de vereadores. Foi “uma coleta desenfreada”, diz o Machado. Acabou metendo a própria mulher, a dona Evarista, no hospício. O padre Lopes, assustado, perguntou ao alienista o que tinha acontecido. Simão Bacamarte contou que a mulher tinha uma dúvida: não sabia que colar usar no baile da câmara: “Alta noite, seria hora e meia, acordo e não a vejo; levanto-me, vou ao quarto de vestir, acho-a diante dos dois colares ensaiando-os ao espelho, ora um ora outro. Era evidente a demência; recolhi-a logo”. E a Evarista não foi sozinha: àquela altura quatro quintos dos itaguaienses já estavam na Casa Verde. Mas de novo o alienista surpreendeu a todos. Mandou soltar todos os internados.

– Mas por quê? – estranhou Pedro Bola.

– Ele disse o seguinte: se o número de loucos era tão grande, o normal era ser maluco. Como explicou na carta que mandou à câmara: “… se devia admitir como normal e exemplar o desequilíbrio das faculdades”, ou seja, das faculdades mentais, da mente. Para a Casa Verde só iriam as pessoas “que se achassem no gozo do perfeito equilíbrio das faculdades mentais”. E o doutor trataria dessas pessoas. O objetivo era fazer com que ficassem perturbadas, para voltar à normalidade, isto é, à maluquice. Machado dá um exemplo: “Suponhamos um modesto. Ele aplicava a medicação que pudesse incutir-lhe o sentimento oposto”. Medicação aí não é injeção ou comprimido: “Às vezes bastava uma casaca, uma fita, uma cabeleira, uma bengala para restituir a ração ao alienado”. Quer dizer: com enfeites, o cara ficava curado da modéstia. E aí não precisava ficar a Casa Verde. Que, no fim de cinco meses e meio estava vazia: todos “curados”, entre aspas.

– Então o alienista conseguiu o que queria? – perguntou André.

– Aparentemente sim. Mas então se deu conta de que, na verdade, aquelas pessoas já eram perturbadas antes: “Os cérebros bem organizados que ele acabava de curar eram desequilibrados como os outros”. O único que era cem por cento sadio era ele, o alienista. “Simão Bacamarte achou em si os característicos do perfeito equilíbrio mental e emocional”; ele era inteligente, paciente, leal, tolerante. Chegou a reunir um conselho de amigos, perguntou se tinha algum vício, algum defeito. Não, foi a resposta unânime, ele era perfeito. Portanto, ele era o único que tinha de ir para a Casa Verde. Foi o que fez, apesar dos pedidos da mulher e dos amigos. Conta Machado: “Fechada a porta da Casa Verde, entregou-se ao estudo e á cura de sim mesmo. Dizem os cronistas que ele morreu daí a dezessete meses, no mesmo estado em que entrou”. E aí termina a história.

Sorriu:

– Agora vocês já sabem porque muita gente aqui em Itaguaí não gosta da Casa Verde.

Os garotos agradeceram à professora e saíram. Tão impressionados estavam, que ficaram parados na frente do colégio, por uns bons cinco minutos, sem dizer palavra.

– Que coisa – murmurou Pedro Bola, por fim. – Que coisa. O alienista trancando todo o mundo na Casa Verde… Parece história de terror. Pode ser inventada, mas está muito bem contada.

– Muito bem – disse André. – Nós temos a história do Machado de Assis, e que eu, aliás, estou ansioso para ler. E isso eu que  não sou de muita leitura, hein? Mas é que  fiquei curioso… Agora: o nosso homem lá da Casa Verde… gente, esse cara também deve ter uma história muito estranha. Acho que nem o Machado de Assis imaginaria um tipo desses. Vocês viram, a história dele termina quando o alienista morre. Como é que ia imaginar um cara se trancando na Casa Verde tantos anos depois? E a troco de quê o sujeito pensa que é o doutor Simão Bacamarte? Isso eu não consigo entender.

– Podem deixar comigo – Arturzinho, misterioso. – Em dois dias garanto a vocês que tenho a resposta para esta pergunta.

– Ah, é? – André, debochado. – E como, pode-se saber? Consultando um adivinho?

– Isso eu resolvo Tenho os meus métodos.

Piscou o olho para Leo, que limitou-se a sorrir. Sabia muito bem porque Arturzinho não queria falar da garota: tinha medo de que André corresse atrás dela. A rivalidade entre os dois se estendia às garotas, e mais de uma vez tinham brigado por causa disso.   André suspeitou de algo:

– Está bem, sabidinho. Mas aposto um CD como você não consegue.

Arturzinho topou. Combinaram novo encontro para daí a três dias, no mesmo lugar.

– Você já sabe – avisou André. – Ou traz a resposta ou traz um CD. Que eu vou escolher.

– Não: você é que vai comprar o CD que eu escolher. E pode ir preparando a grana, porque não será barato.

Feito o desafio, separaram-se. André e Pedro Bola queriam voltar à pizzaria. Mas Arturzinho alegou que precisava dormir cedo. Tinha um compromisso na manhã seguinte.

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O Mistério da Casa Verde 4

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